A Sétima Arte tornou-se a ferramenta de uma porção de ressentidos cujas causas sempre foram questionáveis.
Em meados dos anos 90, James Cameroon resolveu contar uma história, baseada em uma trágica história real. O naufrágio do navio RMS Titanic é, até hoje, uma das mais tocantes tragédias da história do Ocidente, um misto resultante da conturbada relação entre o progresso, ambição, inteligência e arrogância.
Mas quem paga a pipoca pouco se importa. É preciso um romance, uma boa dose de tecnologia e muitos efeitos especiais. Naquela época, as boas histórias contadas pelos velhos anciãos nas varandas de suas casas, não interessavam mais para uma população ansiosa e obcecada por mais experiências áudio visuais fantasiosas, não importando o quanto eram vazias e cheias de pretensões ideológicas.
Na ocasião do lançamento do filme, eu o vi como um colosso
da tecnologia cinematográfica, o filme que ganharia 11 estatuetas, igualando-se
ao incrível Ben-Hur. A cena do naufrágio é realmente de tirar o fôlego. Já A historinha da menina rica que se apaixona pelo pobre era
a mesma de tantas novelas por aqui, temperada com a morte do mancebo,
congelado no Atlântico. E aquela flauta constante da música da Celine Dion,
essa sim, marcou muito. A mídia gosta de explorar os sucessos à exaustão, sem nenhuma
noção de medida. Isso, nem mesmo a
internet conseguiu mudar.
Hoje, não é possível rever o filme apenas como um admirador
da Sétima Arte. Números e recordes não importam para os que apreciam bons filmes.
O caráter das produções entrou em cheque com o advento da Hollywood
Progressista, os choques culturais, a guerra dos gêneros e a mentirosa luta de
classes que só existe na cabeça de quem ganha alguma coisa com ela. Está tudo
ali, a menina mimada, cuja mãe é uma capitalista corrupta que quer casá-la com
um empresário malvadão. O galã jovem é pobre, artista e mostra para a moça como
os pobres são divertidos, demonstrando que eles sabem viver melhor do que os
empresários endinheirados. Os funcionários da White Star Line são alienados e obedientes,
a ponto de ficarem nervosos tentando proteger o patrimônio da empresa em pleno
naufrágio.
Frases como “Eu sinto cheiro de gelo” do vigilante que
poderia ter alertado antes sobre o Iceberg, ou a menina mimada que fez uma observação
técnica sobre como a quantidade de botes não seria suficiente em caso de necessidade,
não são nada perto da discussão da inconformada Rose com sua mãe sobre o seu
casamento, quando a genitora diz: “Somos mulheres, nada é fácil para nós.” É de
cortar o coração.
Talvez essa seja a mensagem do filme, uma eterna luta
libertária que samba sobre os cadáveres de mais de 1500 pessoas, que jamais
poderão reclamar ou desdizer as impressões que Cameroon deixou sobre a tragédia,
colocando-a na vala comum da luta de classes.
Titanic, 25 anos depois eu assisti o filme torcendo para que
o navio afundasse logo.
Obrigado pelas leituras, sejam livres e até a próxima.