Uma visão ácida e consternada sobre a tentativa iminente de destruição de um dos locais mais importantes da história da sociedade civilizada.
imagem: blog do bog. |
Convido o leitor a contemplar a seguinte cena: Um happy hour qualquer com seus colegas de trabalho, homens e mulheres confraternizando numa destas sextas-feiras, música ao vivo, enfim, aquele momento de merecido relaxamento. O lugar, logicamente, é um bar. Pode ser qualquer um, desde o boteco do Zé que agora é cult porque é antigo no bairro, ou até os mais elaborados, em bairro nobre, com uns “bons drinks”.
Todos riem e se divertem, e a cerveja, logicamente, vai ter que ser expelida em algum momento. Por isso, esses locais possuem um local apropriado para destinação adequada do resíduo biológico, conhecido como urina, mijo, ou xixi mesmo. Homens vão mijar, mulheres simplesmente vão ao banheiro. E vão em pares, dando à nossa imaginação várias soluções para esse mistério, alguns imaginam que não há fechadura nas portas, então uma delas sempre fica de “guarda”, outros acham que existe uma mesa de pingue-pongue nos banheiros femininos, outros acham que é o momento da reunião onde elas decidem todos os destinos do mundo, ou pior, o destino dos homens.
Sim, o banheiro feminino tem uma mística toda particular.
Lembro de um diretor na época do Colégio que vivia reclamando que o banheiro das
meninas era sujo e descuidado, “inabitável”. Ele era meio linha dura, então eu
guardava pra mim aqueles pensamentos do tipo: “Tranquilo, ninguém quer mesmo
habitar em um banheiro, professor”. Aos
doze anos, eu estava aprendendo a ter cuidado com as palavras.
Mas há um fato que torna esse lugar tão místico e especial.
Nós, homens, não podemos entrar lá.
Mesmo sendo o pingue-pongue um esporte unissex, somos terminantemente
proibidos de sequer nos aproximar da porta. Vi horrores acontecerem no colégio
a quem ousava quebrar essa regra, unhadas, gritos, suspensão escolar etc. Furos nas paredes eram rapidamente descobertos
e concertados, bancos próximos das janelas eram imediatamente retirados, havia
em torno do banheiro feminino uma imensa operação de segurança organizada.
Cenas engraçadas, mas que serviram para toda uma geração enxergar
e aceitar que o território feminino pertence apenas às mulheres. Uma
organização mínima de uma sociedade que digna respeitar seus cidadãos, cada
qual com seu espaço, de acordo com sua condição real de existência, jamais uma
condição imaginada, inventada, ou fruto de algum subconsciente inventivo ou influenciado
por fatores externos.
Existe um grupo de cidadãos que acredita que essa sociedade
está organizada demais. Apaixonados pela balbúrdia, vandalismo e desconstrução
de qualquer coisa, funciona de maneira anárquica, porém, coordenada. Para estes, o banheiro não pode mais ser
exclusivo para mulheres e homens, tem que ser usado para quem acredita ser
mulher ou homem. Nos Estados Unidos, campo fértil para o crescimento do joio,
os banheiros de alguns colégios que adotaram essa postura já causaram problemas,
e sérios problemas.
Na Universidade Federal do Espírito Santo, os banheiros
agora são para quem é, e também para quem acredita ser. Segundo a coordenação, professores
e funcionários já foram orientados sobre as novas determinações, inclusive “treinados”
naqueles famosos encontros de “conscientização sobre as questões de gênero e
sexualidade e garantia dos direitos humanos”. Anônimos já denunciaram que não
houve consulta sobre a determinação. Anônimos porque certamente vão sofrer
retaliações caso contestem a medida.
Não é difícil identificar na mídia o apoio à unificação dos
banheiros que você, suas amigas e filhas usam. Na série Segunda Chamada, (Globo
Play) mostra-se exatamente essa condição, de uma personagem transexual que é
perseguida e agredida, inclusive no banheiro da escola. E claro com todo aquele
discurso que já conhecemos de inclusão e tudo mais.
Recentemente, uma colunista do Uol fez uma análise sensível
sobre os banheiros das escolas serem espaços de “vivências e convivências entre
os adolescentes”, com abordagens sobre empatia, motivação e inclusão, e reclama
do fato de não ter podido entrar no banheiro masculino “devido a uma divisão
binária de gênero”.
Acabar com a mística do banheiro feminino parece ser uma
questão apenas de desconforto para nós, homens, cujo local não passa de, no
máximo, um despejo de resíduos. Para as mulheres, porém, é a invasão de um
espaço íntimo, de embelezamento, de conversa, e talvez até de um jogo de pingue-pongue.
Homens não pertencem a este espaço e portanto devem ficar de fora.
Colégios, bares, shoppings, não importa, o lugar proibido
deve ficar imaculado da presença infame da testosterona, rebocada de maquiagem
e esticada em cirurgias malucas, que só engana bêbados e distraídos. Para
seu hospedeiro, o banheiro é só um, o masculino, assim está
escrito na biologia e na placa da porta.
Agora uma confissão: quando eu passo próximo a um banheiro
feminino, sempre tento ouvir o barulho da bolinha, até agora, nada.
Obrigado pela leitura e até a próxima.